Chegou aquela época do ano que revemos o que fizemos, o que deixamos de fazer, o que deu certo, o que deu errado e o que acabou empatado. Muito provavelmente haverá coisas que nós preferiríamos esquecer, mas a rotina de revisão e análise periódica do passado também faz parte dos processos de aprendizado, crescimento e amadurecimento.
Vale para as pessoas e também tem validade para as empresas e para os mercados. Provavelmente, em breve você estará fazendo isso na sua empresa, mas com um foco mais contábil. Da nossa parte, cabe analisar agora como foi 2014, verificar as lições que podemos tirar do que vivemos este ano e listar as expectativas para 2015.
Examinando o cenário
Quem acompanhou o noticiário de jornais e TVs muito provavelmente viu as previsões de um ano negro, catastrófico para a indústria automotiva. Houve quem proclamasse expectativas de desemprego em massa, empresas fechando, calotes, etc. Felizmente, nenhuma dessas previsões sombrias se confi rmou. Ainda estamos aqui.
Certamente 2014 não foi um dos melhores anos para o mercado, mas levando em conta as eleições e a Copa, que adicionou um novo e longo Carnaval (e uma “quarta-feira de cinzas” que vamos levar muito tempo para esquecer) ao calendário, podemos dizer que entre mortos e feridos se salvaram todos.
Sem dúvida nenhuma, este não foi um dos melhores anos para a indústria. No entanto, é preciso fazer algumas observações para colocarmos esse fato dentro da perspectiva correta. Além da Copa e das eleições, já mencionadas, vale lembrar que nos acostumamos com um cenário quase que de conto de fadas, com crescimento ano após ano por um período de doze anos.
É como se o seu time do coração tivesse ganho ou no máximo empatado todos os jogos desde 2002. Mesmo o torcedor mais fanático iria concordar que estava bom demais para ser verdade e que mais cedo ou mais tarde o placar seria negativo.
Em doze anos, as vendas da indústria automotiva como um todo cresceram 263%, mais de duas vezes e meia. Nesse período, as vendas de automóveis e comerciais leves passaram de 1,3 milhão em 2003 para cerca de 3,3 milhões em 2014, levando-se em conta as projeções de uma queda de pouco mais de 6% nos números deste ano.
Como o artigo é escrito em novembro e os números só serão fechados no início de janeiro de 2015, é preciso lançar mão de estimativas. Em primeiro lugar, tradicionalmente o desempenho de vendas nos últimos dois meses do ano costuma ser melhor do que nos anteriores.
Além disso, o Salão do Automóvel deve dar uma injeção de ânimo nos consumidores e os descontos no IPI devem ser mantidos só até o final de dezembro, o que deve fazer com que eles antecipem a ida às concessionárias e aproveitem as ofertas preparadas pelas montadoras. Na última década chegamos ao posto de quarto maior mercado automotivo do mundo, crescendo a taxas maiores que as da economia, muitas vezes com números de dois dígitos. Então, era extremamente provável que uma hora fosse preciso dar uma diminuída para retomar o fôlego.
É importante lembrar também que as previsões sombrias fazem parte de um cenário de jogo político-econômico, com as montadoras tentando mostrar dificuldades para convencerem o governo a lhes dar vantagens ou, ao menos, facilidades.
Essa queda de braço é uma constante e é bastante lógica. Cada um dos lados está no seu papel. Cabe a nós não nos esquecermos disso e colocarmos as informações transmitidas pelos veículos de comunicação na devida perspectiva.
Um exame mais de perto
Analisando pelo ponto de vista da indústria automotiva e dos veículos 0km, vale a pena examinar mais de perto a situação do mercado brasileiro de equipamentos de som e acessórios automotivos.
Apesar de 2014 não ter sido um ano dos melhores nem dos mais fáceis, não foi possível perceber problemas mais sérios envolvendo fornecedores, distribuidores e varejistas.
Embora as montadoras continuem a investir na venda de acessórios de marca própria e muitos distribuidores e fornecedores estejam abastecendo as revendas autorizadas, o elevado mark-up (margem de lucro) praticado por elas as coloca em notória desvantagem em relação ao varejo especializado.
Este, por sua vez, acaba prestando serviços de instalação para as concessionárias, o que não pode ser visto necessariamente como negativo, pois ajuda a fazer frente aos custos fixos e, nos casos em que a instalação é feita nas lojas especializadas, até nas vendas.
O varejo virtual pode ser visto como uma ameaça, mas é preciso considerar que as lojas virtuais não têm como instalar o que vendem, o que leva o consumidor a recorrer aos lojistas tradicionais para fazer uma instalação profissional.
E aí é hora de não só cobrar pela instalação como também de oferecer o que o consumidor não comprou, como alto-falantes, amplificadores, equalizadores e outros produtos de som automotivo e acessórios.
O mesmo pode ser aplicado no que diz respeito aos produtos vendidos pelos magazines e lojas não especializadas, que raramente oferecem instalação própria e têm uma variedade de produtos complementares extremamente reduzida. Normalmente, o seu foco se restringe apenas aos aparelhos multimídia e aos players.
Embora o nosso mercado tenha sido afetado pela pequena queda na venda de veículos 0km, é preciso levar em consideração que mais de três milhões de veículos para equipar com acessórios e equipamentos de som automotivo é um volume considerável.
É possível afirmar que não houve uma expansão do varejo especializado que tenha acompanhado o aumento da base de veículos em circulação e das de novas marcas e novas concessionárias autorizadas.
Outro aspecto a ser levado em conta é o pequeno número de varejistas que se dispuseram a desbravar o imenso mercado de veículos usados ou o de caminhões, para os quais já chamamos a atenção diversas vezes aqui na AutoMOTIVO e em palestra no 1º Fórum do Mercado Brasileiro de Som e Acessórios.
Na contramão do mercado de veículos 0km, que deu uma parada para retomar o fôlego e teve uma pequena redução, o de usados continua “bombando”. Segundo dados da FENABRAVE e do DENATRAN, foram revendidos 6,9 milhões de veículos no período de janeiro a setembro deste ano, um crescimento de quase 6% em relação ao ano passado. Para cada automóvel novo emplacado são revendidos 4 usados e que para cada comercial leve que sai de uma revenda, 2,6 usados saem das lojas especializadas. Definitivamente, esse é um mercado que merece ser melhor explorado!
Isso significa que para cada automóvel novo emplacado são revendidos 4 usados e que para cada comercial leve que sai de uma revenda, 2,6 usados saem das lojas especializadas.
Paralelamente, existem ainda muitas oportunidades a serem exploradas no mercado de caminhões e ônibus. Continua valendo a nossa sugestão de parcerias com concessionárias especializadas e frotistas. Lojas localizadas em regiões de concentração de caminhões também podem tirar proveito desse segmento pouco explorado.
Então está tudo bem? Nem tudo. Para que o mercado se fortaleça ainda é preciso investir muito em qualificação, principalmente no varejo, preparando os lojistas e instaladores para enfrentar um mercado cada vez mais exigente e competitivo.
Esse é um desafio que exige a união de fornecedores e distribuidores e pode passar por parcerias com entidades como o SEBRAE e o SENAC na criação de cursos presenciais e pela internet que ajudem os varejistas do setor a se qualificarem, indo além do que é realizado hoje em termos de atualizações sobre instalação e novos produtos.
O que nos espera?
Qual será o futuro do mercado automotivo e, por consequência, do mercado de equipamentos de som e acessórios automotivos? O que podemos esperar para os próximos anos? Até onde é possível prever, em ambos os casos o futuro é promissor, embora não esteja isento de dificuldades.
A FENABRAVE fechou há pouco um convênio com a Caixa Econômica Federal e o Banco Pan para reduzir os juros cobrados nas operações de financiamento de veículos. O acordo deve puxar para baixo as taxas do mercado como um todo e ajudar a aquecer as vendas, ajudadas também por uma medida recente que deverá facilitar e acelerar a retomada de veículos financiados de clientes inadimplentes.
Só agora os primeiros reflexos do Inovar-Auto estão começando a ser sentidos, se traduzindo em modelos tecnologicamente mais próximos dos vendidos nos mercados do Exterior. As montadoras já se comprometeram a investir R$ 74,1 bilhões até 2017, último ano de vigência da primeira etapa do programa, entre novas fábricas, ampliações das existentes, engenharia, lançamentos de novos modelos e processos produtivos.
De acordo com dados da ANFAVEA, até o final desse ano, a capacidade de produção passará a ser de 5,7 milhões de veículos anuais. Como declarou o presidente da entidade, Luiz Moan, “Confiamos no mercado crescente. Ninguém faz investimento para perder. Os investimentos anunciados representam a confiança no mercado de veículos e no crescimento do país”.
Só nos resta estourar a champanhe e torcer por um feliz 2015. Até lá!
Autor: Amadeu Castanho Neto
Ilustrações: Equipe AutoMOTIVO